As investigações dos serviços de água e esgoto, iniciadas em
fevereiro de 2023, foram abortadas depois que a concessionária propôs acordo
com a CPI na Câmara dos Vereadores. A negociação entre a empresa e os
parlamentares causou frustração na população que esperava um rigoroso inquérito
sobre as irregularidades cometidas pela empresa e a sua responsabilização
judicial. Mais uma vez, o poder econômico se sobrepõe à ética e à vontade
popular, numa parceria abominável com os poderes públicos.
Com o acordão, evitou-se a investigação de inúmeras
denúncias que poderiam desembocar no pedido de quebra do contrato de concessão.
Entre essas denúncias destacam-se a utilização de recursos públicos nas obras
da empresa privada, a falta de fiscalização da concessão, as cobranças
irregulares, o descumprimento de metas contratuais, a devastação ambiental e o
impacto na saúde pública, a falta de transparência na gestão do serviço público,
o desabastecimento das periferias, a ausência dos serviços de esgotamento
sanitário, o rompimento de adutoras e a violação do humano à água e ao
saneamento.
O fracasso da CPI foi denunciado por lideranças da sociedade
civil e jornalistas locais. Em artigo do Portal do Holanda (25/05/2023), o editor expressa a insatisfação de quem ansiava
por justiça e maior empenho dos vereadores. Holanda afirma que os avanços foram
escassos. Para ele “a CPI encerra tristemente, sem apurar o óbvio: a concessão
concedida à empresa e suas antecessoras foi marcada por vícios que de certa
forma ainda persistem. A privatização ‘vendida’ para a sociedade amazonense
como solução para os problemas de abastecimento, se revelou uma expropriação de
patrimônio público”.
O editor ainda aponta que a expansão dos serviços de água na
cidade não foi financiada pela empresa, mas bancada pelo contribuinte. Mais uma
vez o poder público transferiu para a concessionária o bônus, cabendo à
população da cidade o ônus de um negócio que só foi bom para a Águas de Manaus.
Se apurou que havia cobranças indevidas, cabia o ressarcimento dos valores
cobrados de forma extorsiva dos consumidores. Cabia estabelecer multas. Cabia
punir os administradores. Nada disso foi feito.
O jornalista conclui, então, que os objetivos que
justificaram a criação da CPI não foram alcançados nem de perto. Infelizmente,
um acordo que reduziu temporariamente a tarifa de esgotamento sanitário soterrou
investigações valiosas que poderiam alterar a trajetória das políticas de
saneamento da cidade. Ilegalidades patentes que prejudicam a população há
décadas foram relegadas a um simples acordo com a empresa. Os vereadores não
cumpriram com o prometido, fazendo vista grossa para as irregularidades da
empresa. A concessionária saiu ganhando enquanto a população continuará
padecendo sob o olhar indiferente do poder público.
Moradores e lideranças sociais não escondem a insatisfação
com o desfecho da CPI da Águas de Manaus. Representante do Fórum Amazonense de
Reforma Urbana reage ao término da CPI dizendo: uma tragédia! Pífio essa
apresentação dos resultados da CPI. Um horror... Liderança do Movimento
Nacional do Luta pela Moradia – MNLM - desabafa: É uma vergonha. Onde estão a Tarifa
social e a Tarifa 10 para quem delas precisa? Onde está a anistia das dívidas de
consumidores irregularmente cobrados? Outra liderança comunitária afirma: pagar
pelo que não recebeu é crime! É o mesmo que o padeiro cobrar o pão que você não
comeu.
Os direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário
permanecerão em último plano para dar lugar aos interesses rentistas da
concessionária. Não há perspectivas de universalização dos serviços, pois os
mais pobres não têm poder suficiente de pagamento. O Estado se omite diante da
sua obrigação, permitindo que a exclusão social e a espoliação urbana sejam
eternizadas. Nunca se viu uma parceria tão bem-sucedida: Estado e Mercado (Prefeitura
e Águas de Manaus) se unindo contra a população visando o enriquecimento de uns
poucos às custas da multidão de manauaras.
Sandoval Alves Rocha
Amazonas Atual: https://amazonasatual.com.br/acordo-desmantela-cpi-da-aguas-de-manaus-que-apurava-irregularidades/
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