A CPI DAS ÁGUAS DE MANAUS
Deparamo-nos, novamente, com boa oportunidade de a Câmara Municipal de
Manaus instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os
serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário realizados pela
concessionária Águas de Manaus. Matéria veiculada pelo site Amazonas Atual, em
16 de maio de 2022, reconhece que falta pouco para lograrmos mais esta
conquista, mas destaca também a morosidade dos vereadores em aderir a esta
iniciativa que pode contribuir com a melhoria da qualidade de vida dos
manauaras, uma vez que a cidade sofre com a precariedade desses serviços.
As
justificativas expostas para a criação da CPI já são bem conhecidas por toda a
cidade, que tem vivido um permanente conflito hídrico e sanitário exposto de
forma especial nesta pandemia. Entre os problemas que precisam ser investigados
encontram-se falhas graves, como a cobrança de taxa de esgoto sem a prestação dos
serviços e os reajustes exorbitantes das tarifas. Também deverão ser apuradas
as interrupções abruptas do fornecimento de água, cobrança de valores sem
efetivo consumo, ausência de relatório obrigatório de cumprimento de metas e a falta
de abastecimento nas zonas Norte e Leste da cidade.
Proposta pelos vereadores
Sassá da Construção (PT) e Rodrigo Guedes (Republicanos), a iniciativa já conta
com o apoio dos vereadores Caio André (PSC), Carpegiane Andrade (Republicanos),
Daniel Vasconselos (PSC), Ivo Neto (Patriota), Raiff Matos (DC), Thaysa Lippi
(Progressista), Willian Alemão (Cidadania), Yomara Lins (PRTB), Amom Mandel (Cidadania) e Kennedy Marques (PMN). Para que a CPI seja
instaurada é necessário mais dois parlamentar, completando 14 vereadores.
Não será
a primeira vez que a gestão dos serviços de água e esgoto é investigada no
período dessa concessão privada. Em 2005, num clima de insatisfação geral com a
prestação desses serviços, a Câmara dos Vereadores de Manaus cedeu à pressão da
população e instaurou uma CPI para investigar a concessionária Águas do
Amazonas, que era controlada pela multinacional Lyonnaise des Eaux. Essa
investigação mostrou a irresponsabilidade da empresa e recomendou a quebra do
contrato de concessão em virtude da inviabilidade da privatização desses
serviços. O prefeito Serafim Corrêa não atendeu as recomendações, ignorando os
resultados da investigação e os apelos da população.
Em 2012, a Câmara dos
Vereadores novamente se depara com o caos do saneamento na cidade e instaura
outra CPI visando investigar os serviços de água e esgoto realizados pelo grupo
empresarial Soluções para a Vida – SOLVI, através da concessionária local. As
investigações aprofundaram as clausulas do contrato de concessão e os
responsáveis pela calamitosa situação dos serviços de água e esgoto. O Inquérito
pôs às claras os engodos da privatização identificando as ilegalidades da
concessão, as relações espúrias entre o poder público e o poder privado e a
enganação que infligiam à população.
A CPI de 2012 também recomendou a quebra
do contrato de concessão, deixando claro que a privatização do saneamento prejudicava
o povo manauara. As metas do contrato não eram respeitadas, grandes somas de
recursos públicos eram transferidas à empresa privada através da realização de
obras, a falta de investimentos por parte da empresa, cobranças indevidas
realizadas em toda a cidade, falta de transparência da empresa e muitos outros.
Novamente, a prefeitura de Manaus, representada pelo prefeito Amazonino Mendes,
ignora as investigações e o sofrimento da população, apoiando a continuação da
concessão.
Atualmente, a gestão dos serviços de água e esgoto é questionada mais
uma vez pela Câmara dos Vereadores, que busca instaurar a terceira CPI da
história desta privatização. Os argumentos são conhecidos por todos, pois os
manauenses sentem na pele todos os dias as consequências dos serviços malfeitos
a pesar de pagarem as tarifas mais caras da Amazônia e do Brasil. A atual
gestão municipal reconheceu a ineficiência da empresa Aegea Saneamento, chegando
a pensar na possiblidade de rescindir o contrato de concessão, mas ultimamente cedeu
às pressões do grupo empresarial, dando as costas para a população.
Esta
história tem mostrado a influência das grandes empresas de saneamento sobre as
decisões do poder público em Manaus. As provas do desastre desta privatização
estão expostas, não somente pelas investigações realizadas pela Câmara dos
Vereadores, mas também pelo baixo desempenho dos serviços evidenciado pelo
Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) e órgãos de denúncias
locais. Esta trajetória mostra que Manaus está indefesa frente aos lobbies
empresariais. Diante dessas forças descomunais, as instituições públicas se
rendem, jogando a cidade e a sua população à própria sorte.
No entanto, a
Câmara dos Vereadores de Manaus tem mais uma oportunidade de expressar a sua
preocupação com o bem-estar da população aprovando a instauração da CPI da
Águas de Manaus. As investigações são um momento especial para a cidade de
Manaus, uma vez que fatos e documentos serão elucidados e publicizados,
permitindo a população conhecer os meandros da gestão privada do saneamento, visto
que tal gestão normalmente carece de transparência.
Além
disso, a CPI da Águas de Manaus será uma boa oportunidade para a sociedade
refletir sobre o desempenho da privatização ao longo das últimas duas décadas,
possibilitando formar opinião esclarecida sobre o que acontece quando os
serviços básicos deixam de ser considerados direitos fundamentais e passam a
ser tratados como mercadorias para beneficiar os donos do mercado.
Analisar os
serviços de água e esgoto de Manaus que estão sistematicamente entre os piores
do Brasil gerará consciência crítica na população, mas também poderá engendrar
decisões mais acertadas sobre a política de saneamento na cidade. Aprendemos
com a própria experiência que a privatização de serviços essenciais nos afasta
cada vez mais da democracia por diminuir o poder de decisão da população,
entregando-o aos empresários e acionistas, que primeiramente têm em vista os
seus interesses econômicos.
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